Testamento

Conheça a história de de Cásper Líbero

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Redigido por Cásper Líbero em 16 de março de 1943
Autenticado em cartório em 02 de setembro de 1943
Mantido o nome “Casper” na grafia original, sem acento.

 

 
“ANTHERO MENDES LEITE, Serventuário Vitalício do 2º Ofício da Família e das Sucessões desta Comarca da Capital do Estado de São Paulo CERTIFICA que, revendo em seu cartório os autos do TESTAMENTO do finado DOUTOR CASPER LÍBERO, deles as folhas duas a quatro (2 a 4), verificou constar o testamento do teor seguinte:
 
– “Em nome de Deus, amém. Eu, Dr. Cásper Líbero declaro que este é o meu solene testamento – cerrado, expressão genuína e espontânea de minhas últimas vontades, pela qual revogo todas as disposições testamentárias anteriores. Sou católico, apostólico, romano, religião que recebi de meus pais, que sempre professei e que tem sido, em todos os lances de existência, o esteio, suave consolo e estímulo de todas as minhas alegrias, esperanças, contrariedades, ações, vicissitudes e lutas pela vida. Sou filho legítimo do Dr. Honório Líbero e Dr. Zerbina de Toledo Líbero, natural de Bragança, deste Estado. Sou domiciliário da cidade de São Paulo, solteiro, sem descendentes nem ascendentes; pelo que me é lícito, em face da legislação pátria, dispor livremente da integralidade dos meus bens de fortuna. Usando dessa faculdade, faço as deixas e disposições que passo a determinar. Celebrei um contrato de compra e venda com a City of San Paulo Improvements and Freebold Land Company Limited sobre o terreno da Rua Estados Unidos n.º 1093, lavrado nas notas do 7º Tabelião, livro 292, fls. 50 v. em data de 19 de Outubro de 1933, bem como um outro para financiamento da construção de prédio edificado no referido terreno, assinado com a mesma Companhia em data de 25 de Abril de 1935, em notas do 7º Tabelião, livro 314, fls. 47 v. As prestações que devo por estes contratos são insignificantíssimas e, como até hoje não recebi a escritura de compra e venda da City, transfiro e lego a dona Marguerite Augustine Leboucher: minha fiel e dedicada companheira dos bons e maus momentos, todos os direitos oriundos desses contratos, afim de a ela ser passada diretamente a escritura e ela ficarem pertencendo, como minha cessionária e legatária, o terreno, edificações e tudo que as guarnecem – móveis, utensílios, alfaiates, tapeçarias e automóvel – pagando o meu espólio as duas prestações em débito e as despesas fiscais. Visto como tudo quanto possuo devo-o à Providência que não me há desamparado e à “A Gazeta”, jornal que é o reflexo e o orgulho de toda a minha existência de labores, sempre ao serviço de São Paulo, do Brasil, da Justiça e das grandes ideologias, quero e disponho que todos os meus bens remanescentes sejam reunidos e aplicados como patrimônio da Fundação que ora crio e instituo, os termos do artigo 24 de nosso Código Civil: bens livres, isentos de ônus reais, gravames ou indisponibilidades, compreendendo “A Gazeta”, o edifício em que se acha, suas instalações e acessórios, a estação de rádio-difusão, os imóveis, móveis, créditos, direitos, em suma, todos os meus haveres, sem exceção de coisa alguma. Nomeio os meus dois irmãos Drs. Nelson Líbero e José Líbero e os meus amigos João Francisco de Ferreira Jorge, Dr. Pedro Monteleone e o Dr. Sylvio Margarido para, em comissão, organizarem a Fundação, formularem-lhe os estatutos e submeterem-se à aprovação da autoridade competente, a fim de que, aprovada, registrada e dotada de personalidade jurídica, receba o patrimônio que lhe destino e entre a funcionar, dentro das bases e linhas mestras que aqui prescrevo e esmiúço.
 
1) Fundação terá o nome que lhe der a comissão e será administrada por esta, convertida em diretoria e composta dos mesmos Drs. Nelson Líbero, José Líbero, João Francisco Ferreira Jorge, Pedro Monteleone e Sylvio Margarido. O primeiro, médico, solteiro, médico desquitado, o terceiro, contador, casado, o quarto, médico, casado, e o quinto, advogado, casado, todos brasileiros, domiciliados em São Paulo.
 
2) Será tríplice a sua finalidade ou objetivo, a saber:
 
a) objetivo patriótico de iniciativas e campanhas por São Paulo, pelo Brasil, pela Justiça, pelos nobres ideais, pela cultura e grandeza de nossa pátria, servindo-se para isso de “A Gazeta”, do seu auditório, do seu Rádio e dos recursos do patrimônio com que a doto;
 
b) objetivo cultural de criar e manter uma escola de jornalistas e ensinamentos de humanidades, particularmente português, prosa, estilo, literatura, eloquência, história e filosofia, em cursos de grandes proporções, a começar pelo secundário e finalizar pelo superior;
 
c) objetivo jornalístico, consistente em assegurar e desenvolver o nome, futuro, prosperidade econômica e prestígio de “A Gazeta”, mantendo-a como órgão de genuína opinião pública e interesses da pátria, aparelhada dos inventos e aperfeiçoamentos que o progresso for engendrando, fidelíssima à elevada finalidade da Fundação.
 
3) Será administrada pela diretoria, a qual elegerá no seu seio um presidente (presidente da diretoria e da Fundação) e nomeará substituto a cada um de seus membros; para que nunca os quebre sua continuidade. Se, porventura, pelo evento de desaparecerem três ou mais de seus membros, ficar a diretoria sem número para funcionar e preencher as vagas, caberá a nomeação ao Juiz de Direito da 1ª Vara a quem couber na capital conhecer dos assuntos de provedoria e fundações.
 
4) Reunir-se-á a diretoria trimestralmente ou com mais frequência, se de conveniência, com a presença mínima de três membros, cabendo-lhe nomear todo o pessoal do jornal e Fundação, fixar-lhe os vencimentos e exercer todos os atos administrativos, bem como os que exorbitem da administração ordinária ou se qualifiquem como de disposição.
 
5) Cabe ao presidente dar o voto de desempate, presidir as reuniões, representar a Fundação ativa e passivamente, em Juízo e fora dela, outorgar mandato, superintende e dirigir todos os serviços, exercer os atos de administração ordinária e gerência limitada, sujeitos ao beneplácito da diretoria.
 
6) Serão fixados atualmente pela diretoria os vencimentos do Presidente, bem como os emolumentos “pró-labore” de seus membros.
 
7) Uma vez aprovados, os estatutos só serão reformáveis nos tópicos administrativos, mediante pelo menos quatro votos da diretoria e aprovação judicial.
 
8) Não respondem seus membros ou administradores, subsidiariamente, pelas obrigações da Fundação.
 
9) A Fundação, como pessoa jurídica de caráter perpétuo, não tem prazo nem condições de extinção; se tratando de vir a perecer por qualquer circunstância inesperada, – coisa que a diretoria deverá ter o maior cuidado de coagir e conjurar – seu patrimônio será incorporado em uma Fundação que na cidade de São Paulo vale pelo bem-estar e assistência dos Jornalistas necessitados ou, não existindo, no patrimônio da Santa Casa de Misericórdia de Bragança.
 
10) Qualquer dúvida que possa ocorrer na vida da Fundação ou omissão que se depare em seus estatutos, será resolvida pelo Juiz a que alude a cláusula 3. Está entendido que a dotação que faço para a Fundação é de todo o seu remanescente líquido, depois de solvidas as custas de inventário, despesas de testamentária e dívidas exigíveis na abertura de minha sucessão. Quanto à minha dívida consolidada e aprazada por prestações, as rendas da “A Gazeta Esportiva”, do seu Rádio e anexou bastam sobejamente para acudir ao respectivo, deixando largos remanescentes. Destas rendas mando que seja retirada a porcentagem de vinte por cento, a fim de ser distribuída aos chefes das diversas secções da “A Gazeta” e anexos, que ocuparem essas posições no dia da minha morte, fazendo-se a distribuição proporcionalmente aos seus vencimentos, conquanto viverem e se mantiverem no exercício efetivo dos cargos. Não contemplo com nenhum legado os meus irmãos Nelson e José Líbero, apesar da amizade agradecida e grande estima que deles faço, pela razão de disporem de recursos próprios e depararem em boa situação, abrisados, perfeitamente, de qualquer necessidade econômica. Nomeio para meus testamenteiros concedendo-lhes a posse e administração da herança aos senhores e Drs. Nelson Líbero, João Francisco Ferreira Jorge, Dr. Pedro Monteleone, Dr. José Líbero e Dr. Sylvio Margarido, os quais hão de servir na ordem indicada, um na falta de outro. Este é o meu testamento cerrado, feito de minha livre e espontânea vontade, a meu rogo escrito de meu punho, em São Paulo, aos dezesseis dias do mês de Março de mil novecentos e quarenta e três
 
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– Nada mais. O referido é verdade e dá fé.
– São Paulo, dois (2) de setembro de mil novecentos e quarenta e três (1943).

 
Eu, Brenno de Toledo Leite, Escrivão Sucessor, subscrevi, conferi e assino: BRENNO DE TOLEDO LEITE”.